Grupo de Ação Revolucionária Antifascista
Fascismo, Antifascismo e Reformismo
jun 10
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(Nota : texto escrito para a FUA em 2020, disponibilizado para o GARA em 2024)
Depois da Primeira Guerra Mundial surgiram os primeiros regimes definidos hoje como fascistas mas, também, os primeiros movimentos antifascistas.
Com o aumento de ataques terroristas de grupos neonazis/neofascistas no mundo (e em Portugal com o caso dos 37 arguidos da Hammerskin), a subida destas forças nas eleições regionais, nacionais e supra-nacionais (União Europeia por exemplo), as palavras fascismo e antifascismo voltaram a ser assunto de debate na população mundial nas duas últimas décadas.
Mas afinal, o que é o fascismo ? O que é o antifascismo? Qual o lugar dos reformistas nesta luta ?
Os termos “Fascismo” e “Antifascismo” voltaram a ser discutidos em Portugal desde de 2016-2017 com o ressurgimento do movimento antifascista através da criação da Frente Unitária Antifascista e de vários núcleos em todo o país.
A conferência internacional neonazi organizada em 2019 em Lisboa e o caso dos 37 arguidos da “Portugal Hammerskin” levados a julgamento por crimes de ódio, violência, roubos, tráfico e tentativas de homicídio, a série de agressões no Porto ou ainda o discurso claramente racista e proto-fascista do partido Chega, voltaram a colocar em evidência o crescimento da extrema-direita em Portugal, como no resto do Mundo mas, também, permitiu que a população portuguesa voltasse a descobrir o movimento chamado “Antifa”, relacionado com os ativistas antifascistas organizados em todo o território.
O tema também ressurgiu no exterior. Nos Estados-Unidos, a morte de George Floyd, homem negro assassinado pela polícia, levou milhares de pessoas às ruas e teve um impacto a nível internacional, com vários protestos organizados sobre o tema do anti-racismo e da violência das instituições infiltradas pela extrema-direita. Na Alemanha, os atentados realizados pela extrema-direita contra populações minoritárias ou ainda responsáveis políticos, permitiu evidenciar uma forte infiltração da extrema-direita em vários setores da sociedade alemã, nomeadamente no exército e nas forças policiais, como nos foi noticiado em 2020 com a dissolução de uma unidade das forças especiais infiltrada por ativistas radicais ligados a organizações neonazis. Na França, o ressurgimento de organizações neonazis paramilitares como o GUD ou ainda a Geração Identitária tem seguido o crescimento do Rassemblement Nacional (antiga Frente Nacional) que aparece hoje como o partido mais votado neste país.
Entre preconceitos sobre o movimento antifascista e a fachada do nacionalismo, atrás do qual se escondem os fascistas modernos, é importante esclarecer o que é afinal o fascismo, onde surgiu, o que defende mas, também, o que é o antifascismo e qual o impacto do reformismo nesta luta que opõe antifascistas a neofascistas.
O que é o fascismo?
O fascismo é um movimento que nasceu na Europa após a Primeira Guerra Mundial, em 1919, quando países como a Itália ou ainda a Alemanha estavam devastados pela guerra. O movimento surgiu com grupos ultranacionalistas que defendem o amor incondicional ao conceito de Nação, defendendo-a com violência e exaltando os valores tradicionais e religiosos. O objetivo é o de restabelecer a ordem, usando a força num Estado totalitário, que se define pela perseguição de qualquer opositor político e a direção de um líder visto como um herói que se sacrifica pelo país.
Uma das características dos regimes fascistas é o culto da violência e do uso de armas para resolver os conflitos políticos, sendo evidente um ódio profundo pela democracia e a ciência. Negam vários momentos da História, que tentam redefinir, e veem a ciência como o progresso indesejado, em contradição com a religião e, por isso, combatem-na veemente.
Outra característica marcante é a mudança do significado de símbolos patriotas. No caso da Itália, por exemplo, Mussolini era cercado de homens armados e uniformizados, ao serviço da Ordem e da Lei. Bandeiras e outros símbolos foram apropriados por este grupo e ser seu apoiante passou a ser o significado de “patriota”.
Mas o fascismo não teve apenas lugar na Itália. Outros governantes usaram este modelo, como foi o caso da Alemanha, com o Adolf Hitler e o nazismo, em Portugal com o António Salazar e o salazarismo, ou ainda com o General Franco na Espanha e o franquismo.
Qual a origem dos movimentos antifascistas?
Em resposta às políticas autoritárias, violentas e anti-progressistas do fascismo, surge o movimento antifascista. Um dos primeiros grupos antifascistas foi o grupo italiano “Arditi Del Populo”, que surge em resposta à tática legalista, e não violenta, adotada pelo Partido Socialista Italiano e o Partido Comunista Italiano.
Este método foi de facto aplicado pelos sindicatos e organizações ligadas a estes dois partidos e formalizado pelo pacto de 3 de Agosto de 1921, assinado com o Partido Fascista Italiano. Na mesma altura, era criada a Organização pela Vigilância e Repressão do Antifascismo, a polícia secreta do regime fascista italiano.
Enquanto isso, na Alemanha, o KPD (Partido Comunista Alemão) priorizava a sua luta contra a Social-Democracia (o SPD) usando, se necessário, alianças com o NSDAP (partido nazista) para aprovar moções de censura contra o governo social-democrata ou organizando greves conjuntas. Prioridade que perdurou entre os anos 20 e 30, acabando em 1932 quando o KPD, dos quais vários militantes eram regularmente agredidos pelos militantes do NSDAP, decidiu organizar uma conferência, no dia 25 de Maio do mesmo ano, que marcou a criação da primeira “Ação Antifascista”, na qual colaboraram organizações do KPD e do SPD, em oposição ao NSDAP ( partido nazista ).
Foi, aliás, nesta conferência que surgiu a primeira versão do logotipo atualmente usado pelos antifascistas em todo o mundo, com duas bandeiras vermelhas.
Durante os anos 80 surge uma nova vaga de organizações antifascistas com a criação da rede descentralizada inglesa do “Anti-Fascist Action”, ou ainda da rede “No Pasarán”. Esta nova vaga diferencia-se do antifascismo dos anos vinte e trinta pela sua independência das estruturas partidárias e da incorporação de organizações anarquistas autónomas. O próprio modelo organizativo é alterado, passando a ser descentralizado, organizado de forma horizontal por coletivos locais e autónomos, que colaboram entre si em várias ocasiões, mas sem organização a nível internacional.
Estes grupos também se diferenciam dos seus antecessores pela recusa de se unir, seja com a direita, seja com a esquerda parlamentar, vista como reformista, em parte responsável pelo crescimento da extrema-direita e potencialmente perigosa para a luta e o modelo organizativo do movimento antifascista. De facto, as políticas reformistas não permitem uma mudança suficiente perante as exigências da classe trabalhadora, acabando por alimentar as frustrações da classe mas, também, o sentimento de traição que leva algumas destas pessoas a procurarem outra alternativa como a extrema-direita.
Também o método usado pelos movimentos reformistas de apropriação e controle dos movimentos sociais, que lhes permite garantir uma parte do seu eleitorado pela partilha do seu programa nestes movimentos ou pela visibilidade que estes lhe dão, alimenta a desconfiança e o afastamento do movimento antifascista para com estas forças partidárias. Esta diferença da “nova geração antifascista” leva à alteração do próprio logótipo, que passa a ser composto por uma bandeira preta e uma vermelha, significando a união entre anarquistas e socialistas na luta antifascista.
O movimento antifascista atual
A situação de crescimento da extrema-direita nos últimos anos, um pouco por todo o mundo, levou a um novo ressurgimento do movimento antifascista em vários países do mundo.
Mantendo um formato próximo das organizações dos anos 90, os chamados “Antifas” voltaram a organizarem-se e mobilizar em várias ações que decorreram em oposição direta às manifestações de grupos neonazis/identitários ou à presença de elementos da extrema-direita em conferências partidárias, levando de novo a luta antifascista para a rua e criando, em várias ocasiões, confrontos violentos entre neonazis e antifascistas.
Esta violência, no entanto, surge apenas em defesa contra os ataques de militantes neonazis contra manifestações que defendem pautas democráticas e dos Direitos Humanos, contra as agressões a ativistas e militantes ou a minorias sociais e étnicas, ou até as próprias ações antifascistas.
Em Portugal
O movimento autónomo antifascista também acabou por ressurgir, ainda que um pouco mais tarde, no território português. Assim, durante o ano de 2016, assistimos ao aumento da presença e da reorganização de grupos neonazis/identitários como a “Nova Ordem Social”, o “Escudo Identitário” ou ainda a “Hammerskin” e a “Blood and Honour”. Movimentos que se desenvolveram sem grande obstáculo perante a conivência das autoridades e dos nossos responsáveis políticos, convencidos de que o fenômeno seria residual e portanto, iria desaparecer de si mesmo. Ao mesmo tempo assistimos também à presença de elementos antifascistas, novamente estabelecidos em Portugal, que trouxeram com eles a experiência da luta antifascista, vivenciada no estrangeiro, e ajudaram na mobilização de outros ativistas que se encontravam dispersos ou pouco organizados. Podemos também observar nesta altura,o sugrimento de vários outros movimentos sociais envolvidas nas lutas pelo feminismo, a causa LGBT ou ainda a luta ambiental, que partilham da ideologia antifascista.
Ano após ano, foram criados novos núcleos antifascistas que mantiveram relações entre si, de forma a tentar coordenar a luta em Portugal, mas também com organizações estrangeiras localizadas em Espanha (especialmente na Galiza), em Itália, na Alemanha e na França, através da sua adesão à rede “Alternative International Movement” (AIM), uma rede antifascista internacional.
A AIM, é uma rede internacional de contra-cultura antifascista ativa em 32 países espalhados pelo mundo e que tem por objetivo ocupar o espaço cultural para impedir a apropriação e recrutamento da extrema-direita, mas também apoiar as várias lutas sociais que ocorrem nos países onde estão estabelecidas as suas secções. A adesão a esta estrutura deu a oportunidade ao movimento antifascista em Portugal de perceber a dinâmica desta luta noutros países, aproveitando as diversas experiências e pontos de vista para tentar criar e implementar o modelo organizativo e os seus métodos de ação em Portugal.
A partir de 2010 observa-se uma generalização desta forma de “internacionalização” da luta nos diferentes coletivos antifascistas espalhados pelo mundo, seja através da adesão à AIM, ou a outras estruturas internacionais, como resposta às ligações que a própria extrema-direita criou e reforçou nos últimos anos.
Esta tática de internacionalização das relações entre coletivos antifascistas acabou por levar a uma nova forma de organização destes coletivos, que foge um pouco da estrutura que o movimento adotou nos anos 90 e que era mais isolado, limitando-se a colaborações nacionais ou regionais. A notar que, hoje em dia, os coletivos antifascistas espalhados pelo mundo tendem a adotar uma espécie de modelo híbrido entre o que foi o movimento antifascista nos anos 20-30 e o movimento antifascista dos anos 90. A independência partidária e a recusa de alianças com a esquerda parlamentar é própria do movimento dos anos 90, mas a organização e a estruturação dos coletivos que procuram se organizar em torno de uma coordenação nacional ou internacional, é mais própria do movimento dos anos 20-30. E os coletivos em Portugal não são exceção à regra, como temos visto através da criação de uma organização nacional (Frente Unitária Antifascista) ligada a uma organização internacional (Alternative International Movement).
A luta do movimento antifascista contemporâneo em Portugal
O ressurgimento do movimento antifascista em Portugal e o reforço da sua atividade e presença levou à criação, em 2018, de uma “Frente Unitária Antifascista” (FUA), inicialmente composta por organizações de esquerda, entre as quais organizações anti-racistas, feministas, LGBT, associações pelo direito à habitação, coletivos antifascistas e sindicatos. Uma frente criada no final de uma conferência sobre a extrema-direita organizada em Braga pelo núcleo antifascista local, que revelou a presença, a atividade e a forma como se organizavam vários grupos de extrema-direita em Portugal, França e Brasil, levando as várias organizações e pessoas presentes a exprimir a vontade de unirem esforços na luta contra a extrema-direita em Portugal e no mundo.
A criação desta frente permitiu também a organização de várias ações, nas quais estiveram envolvidas várias organizações e pessoas que tinham aderido a FUA, ou que a apoiavam. Estas ações foram várias e diversificadas, desde a oposição direta, como as duas contra-manifestações organizadas em Braga em resposta a uma concentração do PNR, e da tentativa de criação de um núcleo do “Escudo Identitário”, ou ainda a contra-manifestação organizada em Coimbra em resposta ao protesto do PNR, contra a vinda de um ativista LGBT brasileiro para uma conferência na Universidade, de tomada de posição como em Agosto de 2019 com a manifestação organizada em resposta a uma conferência neonazi internacional em Lisboa, ou ainda na série de manifestações anti-racistas e contra a violência policial que a Frente Unitária Antifascista co-organizou ou na qual participou, em resposta aos casos dos jovens afrodescendentes agredidos na esquadra da PSP na Cova da Moura, da violência policial nas intervenções no bairro da jamaica e durante a detenção da Cláudia Simões, do assassinato do jovem estudante cabo verdiano Giovani em Bragança, ou ainda em resposta a agressão e insultos racistas sofridos pela Nicol no Porto por um agente de segurança de transportes públicos.
Mas a Frente Unitária Antifascista não foi apenas criada para responder aos ataques da extrema-direita e as consequências do seu crescimento e atividade. Também foi criada para poder consciencializar o povo através de conferências e debates, que foram organizados sobre várias questões como a luta sindical, os direitos LGBT, a luta feminista ou ainda a luta anti-racista, em colaboração com várias organizações e personalidades reconhecidas destas áreas, levando a que cada vez mais pessoas possam perceber o que é o fascismo, o antifascismo e as diferentes lutas envolvidas no confronto entre estas duas forças.
Também nesta altura, foram realizadas várias ações de cariz social, como a angariação de fundos e ajuda na remodelação de um local pertencente a uma associação sócio-cultural que permitiu a sua reabertura, a recolha de bens e alimentos para pessoas em situação precária e sem-abrigos, ou ainda o apoio nas várias lutas com a qual a FUA esteve alinhada. Vários eventos culturais foram também organizados com o objetivo de poder ocupar este espaço no qual a extrema-direita se tenta infiltrar para ganhar novos adeptos. Eventos como o festival Rock Contra o Racismo organizado em Braga, a projeção de vários documentários sobre as revoluções em curso no mundo ou ainda sobre a situação no bairro da Exarcheia na Grécia, que contou com a participação do realizador do documentário, o Yannis Youlountas, que permitiram oferecer uma alternativa à cultura mainstream com a disponibilização de uma agenda cultural revolucionária e antifascista, aberta a todos e todas, inclusivo as populações mais precárias que acabam por não ter acesso a cultura por causa dos custos de acesso a mesma.
Durante estes anos que marcaram o ressurgimento do movimento antifascista em Portugal, comprovou-se que este movimento era o contrário do que ditavam alguns preconceitos segundo os quais os antifas seriam gente violenta, interessada apenas pela destruição da propriedade privada e conflitos físicos com neonazis. um grupo alarmista sem nada mais para fazer e focado num hipotético perigo marginal ou ainda um grupo de comunistas dirigidos pelo BE ou pelo PCP quando, na verdade, o movimento foi e é composto por elementos de várias ideologias e não é controlado por qualquer partido político. Infelizmente, e vindo comprovar o resultado da infiltração de partidos no movimento antifascista, a FUA rebentou em Setembro de 2021 depois uma tentativa de tomada de poder por um partido trotskista (Movimento Alternativa Socialista). O resultado desta tentativa foi a cisão em duas organizações, a Rede Unitária Antifascista controlada pelo partido, e a União Antifascista Portuguesa formada por independentes.
Em Guimarães também, uma ofensiva do Bloco de Esquerda para tentar captar o núcleo acabou por esvazia-lo e limitar a sua capacidade de luta. Felizmente, este núcleo consegui aguentar e, bem que enfraquecido, continua hoje a sua luta focando sobretudo na denúnica e exposição dos elementos e do discurso neofascista em Portugal e no apoio às ações organizadas pelos setores minoritários que são atacados pela extrema-direita. Com os anos, as duas estruturas acabaram por desaparecer, deixando apenas alguns núcleos ativos no território português nomeadamente o núcleo do Porto e de Lisboa. Outra consequência desta tentativa de controle por um partido, foi o afastamento de centenas de ativistas e a desconfiança nutrida para com o movimento. Assim, podemos dizer que de 2021 a 2024, o movimento antifascista em Portugal foi efetivamente derrotado e limitado às poucas ações que PALVT - Plataforma Antifascista de Lisboa e Vale do Tejo, NAP- Núcleo Antifascista do Porto e NAG - Núcleo Antifascista de Guimarães, conseguiram desenvolver. Felizmente, em 2024 vemos ressurgir alguma movimentação a nível da luta antifascista, com algumas ações realizadas em resposta à ofensiva conservadora (por exemplo as manifestações anti-Islão organizadas pelos 1143) e a vontade de uma nova geração de ativistas em se organizarem em novos coletivos. Esta nova "vaga antifascista" é marcada pelo surgimento desta nova geração de ativistas mais novos mas, também, pelo regresso de ativistas mais antigos, dando esperança de que o movimento possa ser reconstruido em Portugal. Assim, vemos a atividade antifascista retomada em Lisboa pela PALVT, no Porto com a criação do GARA - Grupo de Ação Revolucionária Antifascista no Porto e a continuação das atividades do NAP, em Guimarães com o trabalho que tem sido realizado pelo NAG mas, também, com ações realizadas um pouco por todo o país por ativistas independentes que se tentam organizar e formarem novos núcleos. Os vários contactos que tem sido feitos com os coletivos ainda ativos confirmam o ressurgimento desta nova vaga e a vontade de se organizar, deixando prever a construção de novos núcleos pelo país e de uma nova estrutura nacional.
Os conflitos entre o movimento antifascista e o setor reformista em Portugal
Factualemente, o movimento antifascista em Portugal foi o principal ator da luta contra as organizações de extrema-direita em Portugal e assumiu a primeira linha de combate contra a extrema-direita e as organizações neonazis que se tem desenvolvido em todo o território. Seja de 2018 a 2021 com a FUA, ou em 2024 com os ativistas independentes e os coletivos do GARA, do NAP e da PALVT.
Mas infelizmente, os ataques contra o movimento não tem vindo apenas da extrema-direita, como era de esperar, mas sim de uma grande parte do setor reformista português, representado por partidos parlamentares e organizações que lhe são ligadas. O mesmo setor que hoje tentou protagonizar esta luta captando os ativistas e núcleos antifascistas quando na altura em que ressurgiu o movimento, acusava os antifascistas de exagero e de alarmismo quando estes denunciavam a extrema-direita e as suas organizações.
A verdade é que vários são os elementos que incomodam este setor, levando-o a tentar atacar o movimento antifascista para silenciar as suas criticas às organizações reformistas e afastar dele os seus militantes, ou levando-os a tentar se apropriar dele com o objetivo de reorientar a sua força para objetivos partidários e para tentar encontrar novos militantes. Aos olhos dos reformitas, o movimento antifascista à demasiado revolucionário, demasiado independente, demasiado antifascista…
Mas a realidade é que o movimento antifascista é um movimento independente, que não aceita a instrumentalização partidária com a qual este setor se foi acostumando com os anos, causando assim um desconforto para quem tem por hábito de controlar as movimentações das massas nas ruas. Bem que aberto à colaboração com o setor reformista em prol da unidade de ação na luta, ficou claro de que o movimento antifascista se recusava a ceder às políticas deste setor e continuaria firme nas suas críticas destas políticas que considera ser uma das razões que tem levado ao crescimento da extrema-direita em Portugal. Não esquecemos que os reformistas sempre se esforçaram de tentar silenciar tudo o que era relacionado com a extrema-direita, acabando por dar espaço para que este se desenvolve sem qualquer obstáculo. Baseando-se na falsa teoria de que através da nossa luta, estaríamos a dar protagonismo à extrema-direita quando, na verdade, ela já tinha garantido o espaço mediático que necessitava, há bastante tempo. O único efeito desta tentativa de ignorar o problema foi permitir que este pudesse se exprimir sem contra-argumentação, sem denúncia, sem contraditório.
Um desconforto que é reforçado na aproximação de eleições mas, também, do mediatismo que tem havido sobre a questão do antifascismo, metendo a luz do dia a total ausência deste setor na luta e representando desta forma um risco perante o seu eleitorado que pode vir a divergir e afastar-se deste setor por este não se assumir nesta luta de forma efetiva e frontal, limitando-se a mandar umas pescadas de vez em quando e fazer promessas que não cumpre.
Este fenómeno confirmou-se aliás com o tempo, através da adesão de vários militantes destes partidos e organizações, ao movimento antifascista, em clara oposição à política levada por este setor tal como é regularmente observado nas declarações destes mesmos militantes no seio do movimento e das suas organizações. Não será por acaso que por exemplo, durante o processo de construção da manifestação “Resgatar o Futuro” em 2020, várias organizações inicialmente envolvidas acabaram por se afastar da plataforma organizativa inicial. De facto, nas primeiras reuniões foi imposto um manifesto, não deixando qualquer espaço as organizações convidadas a participar, para poderem construir o manifesto em conjunto, acrescentando propostas ou alterando as que não achavam pertinentes. Comprovando uma vez mais a vontade por parte deste setor de controlar as massas e não deixar espaço para a auto-organização e a tomada de decisões pelos próprios ativistas.
O resultado foi um manifesto muito vago, sem exigências específicas nem nomeação das pessoas visadas pelas exigências e que acabaria por ter menos organizações a subscreverem do que o manifesto alternativo que apareceu a seguir, construído pelas organizações independentes.
Este método de funcionamento e o afastamento da grande maioria das organizações convidadas levou na altura a FUA a contactar estas organizações e outras que não tinham sido convidadas, para tentar convencê-las de continuarem mobilizadas, não se retirarem da manifestação e desta forma, criando com este conjunto de organização, um novo manifesto que possibilitou a mobilização destas organizações e a força prevista para estas manifestações.
Foi atravès de reuniões onde realmente todos podiam participar, dar a sua opinião e meter a sua pedra no edificio, que ficou decidido todos participarem na manifestação mas, atravès de outro manifesto, reconstruído de forma democrática, ao qual subscrever este conjunto de organizações e outras que os apoiaram.
Neste momento já era claro que o setor reformista queria impor a sua linha política, não deixando espaço para que outras organizações que não lhe sejam ligadas, possam complementar o manifesto e arriscar inserirem exigências e críticas ao governo que este setor apoiava.
Outro elemento é sem dúvida a presença maioritária de militantes revolucionários neste movimento, que não poupam de críticas às soluções governativas destes últimos anos, que representam um claro apoio a burguesia, de forma mais ou menos assumida.
Não será por acaso que nas manifestações dirigidas por este setor, as palavras de ordem marcaram-se pela total ausência de críticas e exigências aos últimos governos, indo até a tentativa de silenciar estas críticas e exigências e ostracizar coletivos e organizações independentes como temos visto nas comemorações do 25 de Abril ou do 1 de Maio. A desculpa, é sempre a mesma. A critica feita contra a esquerda seria, segundo eles, força para a direita. Não percebendo que é exatemente a falta de critica na esquerda que faça com que a direita ganhe cada vez mais força. Vinham com o argumento de que estes governos eram sempre melhor do que termos um governo de direita.
Mas afinal, será tão diferente? Não temos vindo a assistir durante a geringonça e o governo de maioria do PS, a requisições civis contra trabalhadores em greves e proibições de direitos fundamentais como o direito à resistência por parte de governos “de esquerda”? Não será também estes mesmos governos “de esquerda” que tem vindo a aceitar migalhas para o povo enquanto milhões eram transferidos para bancos e empresas privadas? Não seriam estes governos “de esquerda” que se deram ao luxo de silenciar uma deputada negra eleita recusando-lhe o direito à intervenção nas comemorações do 25 de Abril? As críticas que o movimento antifascista faz a direção deste setor reformista (e não a sua base militante) tem por objetivo apenas e somente, criar pressão na sua direção para que esta tome consciência da necessidade de priorizar a luta antifascista e voltar a conectar-se à classe trabalhadora e às suas necessidades. Ao contrário do que tem sido as prioridades atuais da nossa esquerda, que são as questões eleitoralistas e divergência programáticas entre partidos de esquerda. Também fazemos esta critica para que tomam consciência da responsabilidade que tem no crescimento da extrema-direita pelas suas decisões políticas tomadas nos últimos anos, que representam uma traição para a classe trabalhadora que ela abandonou para poder dar o seu apoio a burguesia. A primeira reação do setor reformista face ao ressurgimento e crescimento do movimento antifascista foi tentar controlá-lo. Observamos a paralisação de alguns núcleos que tinham surgido nos primeiros anos, fruto da injeção de militantes e quadros deste setor que acabaram por conseguir redigir toda a atividade destes grupos na manutenção de intrigas e guerrinhas ou transformando-os em “clubes de leitura para pseudo-intelectuais”. Infelizmente, com o tempo acabaram por conseguir e o movimento foi apagado de 2021 a 2024. Felizmente, hoje temos uma vantagem que não tinhamos na altura, a de conhecer estes métodos e termos consciencia de como operam para neutralizar movimentos que fogem do seu contrôle. Mas não pensem que o facto do movimento ter quase desaparecido nos últimos anos nos deixa agora descansados para voltarmos a contrui-lo! Bem pelo contrário... mal começaram as ações da nova geração, o setor reformista já se movimenta para tentar desacreditar as organizações e ativistas antifascistas na esperança de manter o contrôle e evitar novemente o crescimento do movimento. A notar que atualmente, podemos observar que até algumas organizações supostemente "revolucionárias" acabam por aderir a este ataque do setor reformista contra o movimento antifascista.
Este conflito é claramente expresso na postura sectarista e divisionista do setor reformista, que se traduz nos movimentos sociais que controla, com a vontade de compartimentação das diferentes pautas que constituem a luta antifascista através de linhas políticas identitárias, a ausência deste setor nas lutas que não dirige e na quais se recusam a qualquer tipo de apoio, ou ainda os ataques de muito baixo nível lançado contra ativistas do movimento antifascista na tentativa de lhes retirar credibilidade e os afastar das massas e das lutas.
Um dos exemplos desta postura foi uma das últimas manifestações antifascista marcada para o 26 de Junho de 2020 ( e cancelada apenas um ou dois dias antes usando o Covid-19 como pretexto) por organizações anti-racistas ligadas a este setor, na qual nenhum coletivo antifascista, seja ele aderente ou não da Frente Unitária Antifascista, foi contactado seja para participar na organização seja para participar na própria manifestação. Também, mais recente, o evidente sectarismo que levou a organização do 25 de Abril e do 1 de Maio a afastar os coletivos revolucionários e independentes, indo até por um cordão policial na sua frente para os separara do resto da manifestação.
Outro exemplo será sem dúvida a tal manifestação do dia 6 de Junho de 2020, que foi pretexto para a organização “Atravessar a tempestade, semear o futuro”, supostamente “revolucionária” (mas que, na verdade, nasceu por várias razões das quais, a vontade de integrarem o setor reformista) lançar um ataque ao movimento antifascista, usando alguns dos seus ativistas e elementos da sua direção para partilhar diversas difamações com acusações bastantes sérias mas, pelas quais nunca aceitaram apresentar provas, com o objetivo de serem destacados pelo setor reformista e aceitos.
Um ataque que terá sem dúvida, encontrado as suas motivações também no facto dos antifascistas terem conseguido manter um conjunto de organizações mobilizadas para a manifestação do 6 de Junho de 2020, enquanto a plataforma inicial de organização (dirigida pelo setor reformista) os tinha perdido, afastando-os da mobilização e arriscando que estes não participem e retiram força as mobilizações.
Mas o facto é que, bem que as acusações tenham sido retiradas passado uns dias, fruto da pressão exercida por vários ativistas e organizações que exigiram provas dessas acusações, este método foi revelador do nível ao qual o setor reformista está disposto a descer na sua tentativa de destruição do movimento antifascista e afastamento dele das massas que o apoiam. Método que ainda se confirma hoje, com acusações e ataques feitos regularmente a ativistas e dirigentes de organizações antifascistas passadas ou presentes, que recusaram se submeter aos reformistas.
O objetivo do movimento antifascista nos próximos meses
O movimento antifascista sempre se mostrou aberto a colaborações com todas e quaisquer organizações e pessoas que defenda valores progressistas. Fora alguns grupos marginais e sectaristas que tendem a desaparecer com o tempo, todos os grupos estiveram envolvidos em várias lutas, lado a lado com os ativistas de outras pautas que constituem também a luta antifascista. Sejam estas lutas dirigidas pelo setor reformista ou não.
O movimento antifascista expressou por várias ocasiões a sua vontade de unir as forças progressistas em torno da luta antifascista e de criar uma unidade de ação efetiva, na qual os sectarismos e divisionismos não serião tolerados e na qual as divergências políticas serião deixadas de lado para poder priorizar a luta contra o inimigo em comum das forças progressistas que representa a extrema-direita.
Mas que fique claro, esta vontade de colaborar nunca serà ultrapassada pela necessidade e vontade que temos em manter o movimento antifascista independente.
O objetivo nos próximos meses será sem dúvida de continuar a reforçar o movimento com campanhas de recrutamento e a ajuda na criação de novos núcleos, permitindo voltar a criar um movimento com força e expressão, que possa realmente atuar e barrar caminho à extrema-direita.
Também temos que manter como objetivo a criação de novos contactos e colaborações com organizações antifascistas de outros países e com organizações nacionais com as quais existe entendimento para poder se colaborar, para garantirmos mais força e potencial para derrotar a extrema-direita e as suas organizações.